31/08/08

“O PAPEL DO ARQUITECTO II”
Este é dos temas mais fáceis de divagar e ao mesmo tempo nunca o mesmo encontra uma definição correcta, completa ou resumida do que possa ser o arquitecto.
Ser arquitecto é um conjunto de condições amplas e pouco definidas mas ao mesmo tempo completas e polivalentes pois não podemos balizar, quer o desempenho, quer a actividade do arquitecto, ou mesmo o que é um arquitecto completo!
Seria mais fácil definir os primeiros passos ou condições para que possa um dia vir a ser “arquitecto”.
Um médico é um licenciado como outros. Tira um curso, faz uma especialidade e torna-se Doutor. Um engenheiro, idem aspas. Um advogado igualmente!
Mas se pensarmos o que é ser alguma coisa realmente, podemos chegar á conclusão que deverá ter um conjunto de conhecimentos, não bastando este conhecimento pois deverão estes profissionais ter a respectiva aplicação prática dos conhecimentos adquiridos.
Podemos ter um licenciado em medicina que certamente conhecerá as partes do corpo, mas nunca no seu desempenho um Bom médico, pois não chegará o dito conhecimento para curar ou operar ninguém.
O mesmo posso dizer de um advogado ou de um engenheiro.
No entanto, procurando uma analogia e comparação com estas profissões, para ser arquitecto, com a mesma razão de ser, terá de demonstrar os conhecimentos adquiridos e pôr em prática os mesmos, desenhando, projectando e desempenhando a sua função como um medico na sala de operações ou um advogado argumentando a sua causa em tribunal.
No entanto e tentando não menosprezar o papel dos outros profissionais, talvez não caiba ao medico aprofundar os seus conhecimentos em historia ou a um advogado lhe seja pedido noções de ergonomia.
Por isso ao reler Vitrúvio encontrei argumento nos meus discursos das minhas aulas, quando digo que o arquitecto é o ser, individuo, profissional mais completo e pretensamente munido da maior informação em todas a as áreas.
Como diz Vitrúvio, não chega apenas conhecer os instrumentos da sua representação bidimensional ou mesmo tridimensional. Deverá conhecer anatomia, leis, conhecimento dos astros e do clima, das realidades sociais e culturais neste mundo global onde as diferenças e fronteiras não se resumem já às diferentes identidades do seu país ou mesmo da sua área de intervenção.
Deverá perceber como construir, em quê, para quem e outras tantas equações complexas do seu exercício profissional.

Mais ainda referindo-me a Vitrúvio, sempre presente o papel do arquitecto como actor pensante pois única forma de, com ordem, com coerência, definir a sua actuação mas não poderá ele mesmo ser completo senão conhecer na prática o resultado do seu trabalho.
Concluímos que o arquitecto é um obreiro consciente e sabedor, filosofo da construção e da sociedade.
Depois de uma pergunta de café, ontem, acrescento o papel do arquitecto na sociedade enquanto principal motor e condicionador de comportamentos e identidades de uma cultura.
O papel assim, transcendo tudo o que Vitrúvio referiu no primeiro livro e restantes, fica completo com a responsabilidade acrescida do que possa causar na sua boa ou má actuação enquanto profissional.
Sobre isto prometo escrever mais, mas fica aqui registado que o arquitecto é um dos mais responsáveis pelo perfil cultural, pois este desenha o seu espaço, as suas ruas que levam e conduzem o indivíduo, cria sensações e emoções, condiciona o seu espaço privado e público e assim, faz com que o indivíduo, seja ele mesmo um pivô, às vezes inconsciente e ingénuo, moldado e orientado segundo as nossas regras.
Ser arquitecto é acima de tudo ser um Big Brother com as vantagens e responsabilidades que o nosso exercício impõe.

Sejamos então conscientes pelo menos do nosso papel e do que os nossos actos provocam nesta sociedade tão frágil e vulnerável, consumista e ingénua quando confrontada com o que fazemos.
nuno oliveira, arquitecto, Agosto 2008

26/08/08

estamos em edição!!
logo que possivel preencheremos algo para o entreter.
(A comissão fabriqueira do blogue)

25/08/08



Escritos14, 17.09.2005
CASA AO – (Ana Oliveira)
“Acho importante num sentido de dar resposta ao objectivo desta compilação, referir alguns aspectos que para além do conceito e projecto em si, no cumprimento programático que como todas as obras, resultam numa série de impressões iniciais, interpretações do programa e do próprio objecto que aí vamos colocar. No entanto, como sempre insisto, o objecto primeiro de fazer arquitectura num sentido generalizado é a construção, com um programa, uma lógica, mas ao mesmo tempo a resposta clara a uma necessidade de “abrigar”, contando mais ou menos histórias, enfatizando ou tornando o desenho mais elaborado, o entendimento dos processos construtivos, da sua execução, da sua... “materialização”. Um pormenor bem executado porque bonito é apenas o resultado de uma intenção conceptual, mas uma decisão de base, qual a estrutura, qual o pormenor de execução em grosso ou em acabamento é o que na realidade faz uma obra de arquitectura ser diferente de uma construção. Uma soleira bem desenhada, “bonita” mas que resulte numa infiltração é a certeza que o desenho ou a execução estava errada, o que torna o próprio papel do arquitecto na responsabilidade principal, pelo desenho ou pela falta de orientação e cumprimento do mesmo.

Então, para não alongar neste primeiro texto aqui introduzido e especificamente destinado à tal componente pedagógica que pretendemos dar com obras nossas e com a nossa experiência pessoal, dita e escrita na primeira pessoa, a complexidade de infra-estruturas, o aquecimento central, a aspiração central, a domótica, toda uma rede de especialidades que se cruzam e condicionam no desenho, na espessura, na dimensão são temas que levam a um resultado que não é isento de todas estas questões e se torna uma componente do nosso próprio exercício profissional.

Neste caso e nesta obra, aspectos como os muros de suporte, a estrutura do alpendre, uma viga suspensa sobre a porta da garagem disfarçada pelo desenho de alçado, um pórtico que nascera da compreensão e conceito de alpendre, quer ao nível funcional, quer ao nível físico pois a sua orientação solar, exposição aos ventos dominantes, entre outros aspectos levam à tal complexidade de condicionamentos no exercício profissional. A escolha de materiais, a sua execução, a sua cor a sua textura, uma pedra “escacilhada”, ou um soalho de freixo, um painel folheado, suspenso, um painel favelado, folheado, lamelado, que exige uma atenção redobrada na sua execução é cada vez mais, por um lado a razão e preocupação do arquitecto, mas ao mesmo tempo no meu entender a lacuna e isenção mais preocupante na classe dos novos arquitectos.

A relação com a luz, com o espaço exterior e com a paisagem como reflexo, partilha e resposta do e para o cliente… os grandes envidraçados com os estores exteriores laminados, criando um espaço de alpendre frontal, mas ventilado, são alguns dos aspectos a que me refiro e que podem dar discurso a uma aula teórica mas ao mesmo tempo a uma razão lógica explicação clara e objectiva, resposta a questões tão objectivas e prementes como esquecidas muitas vezes no ensino da arquitectura actualmente.”
Escritos 14, 17.09.2005- casa AO

excertos de uma entrevista-"O papel do arquitecto"






"O papel do arquitecto"



O gosto pelo que faz…
Sim, muito!. Não escolheria outra profissão. No entanto, desempenho outras profissões que complementam e me realizam como pessoa e como arquitecto. O ensino, a música e a família.
(…)
Sobre a escolha…
Sim, ou melhor… não sabia o quanto desempenharia na sociedade um papel tão importante. Ser arquitecto afinal, não é só fazer projectos, mas sim, conhecer as pessoas que vivem os espaços que eu projecto, outras culturas se falarmos em projectos fora da nossa área de trabalho e por isso conhecer outras realidades, outras pessoas, outras culturas, outras identidades.
(...)
Dificuldades…?
Sim. O facto de me ter descurado no ensino complementar!!. Perdi um ano porque me deixei adormecer pela irresponsabilidade de não estudar!! Entre outros momentos e num ímpeto meio adolescente, decidi ir para a força aérea. Vejam lá!! …E senti a falta de todas as matérias que deveria ter aprendido mais e melhor… até no ensino complementar...
(...)
“Tendo em conta que é um bom arquitecto como acha que chegou a essa opinião?”
(sorriso)!! Seria pretensioso da minha parte considerar-me um bom arquitecto, mas na verdade, sou obrigado a reconhecer que sim... Sou bom arquitecto!..
Por vários motivos:
Trabalhei muito para não ser apenas um arquitecto… estudei, procurei evoluir, aprender sempre, nunca achar que já sabia… em cada obra, em cada um dos muitos cursos que exageradamente decidi tirar na perspectiva de querer saber um pouco de tudo!!, com cada um dos meus carpinteiros, serralheiros, trolhas ou outras especialidades, procurei sempre ouvir, escutar, perguntar e assim descobri que tinha sempre muito que apreender. A humildade em achar que temos sempre muito mais para saber ajuda a crescer como profissional e como pessoa e ser sempre melhor.
Por outro lado, agora que sou professor desta área e que vi a arrogância com que muitos alunos entram num curso superior e pensam que ser arquitecto é ter um diploma, vejo e sinto-os no seu desempenho com alguma mágoa e tristeza. De certa forma, por vezes envergonho-me das suas atitudes e da sua forma de estar como profissionais… e então aí ganho com a tristeza, consciência que sou melhor de que eles.. infelizmente porque cada vez menos ambicioso por uma capa de revista e mais pelo reconhecimento de fazer bem!!
Mas concluo, olhando para os que são ainda melhores…:
- Ainda tenho muito que apreender…!
Por fim, lamentavelmente chegando a essa conclusão, percebo que tenho uma responsabilidade acrescida sobre a cidade, sobre as pessoas, sobre a nossa cultura…e quando vejo que o que faço mal, provoca mau estar e quando faço bem sinto o que melhor pode sentir um arquitecto.. funciona bem!.. e é bonito!!
(...)
maior projecto…
Todos os meus novos projectos são sempre os melhores e cada vez aprendo mais e sinto que vou dar melhor e mais do que já dei, seja um casa, um edifício, uma rua, ou um móvel.. é o mal de ser arquitecto…. Nunca paramos e sonhamos em cada projecto que este ,…. Sim ..!!!.. este vai ser o melhor da nossa carreira..
Hoje talvez uma recuperação de uma fortaleza em cabo verde!!
Amanhã… a tua casa!
(...)
outra profissão
Sim, cantor, musico, médico, e acho que a minha profissão ensina acima de tudo a organizar a minha vida, as minhas tarefas, sempre com uma ordem, com uma lógica e organização de pensamento, por isso, agora posso dizer que até gostava de experimentar outras profissões. Já fiz trabalho de carpinteiro, de trolha, de electricista, mas gostava sempre de aprender outras áreas fora da minha profissão..
(...)
Alguma vez… …pensou em desistir?
Não pensei!!.. Desisti, várias vezes!
O meu curso na altura era muito difícil!!.. , muito trabalho, dormia 4h por dia durante muitas semanas. fiz muitas directas, estudei arte, história, sociologia, matemática, geometria, física e para alem disto, os meus desenhos, os meus projectos…
E se no inicio do curso não levei tão a sério, logo vi que não podia ser o pior.. pensei sempre.. se tentar ser o melhor.. posso não conseguir sê-lo, mas porque tentei muito… pelo menos seria bom,!! Foi esse o lema de toda a minha vida..

Por isso desisti duas vezes. Uma dessas… arrumei a mala, deitei fora o trabalho e desisti. Num almoço, a minha namorada e família, convenceram-me que pelos menos não perderia o ano lectivo se tentasse acabar com o que tinha…
Não dormi durante uma semana…
Mas acabei!.. e foi o melhor ano da minha vida e das maiores lições. fui o melhor aluno do ano e esse ano foi o que me levou a ser convidado para trabalhar com vários arquitectos .. Eles sim mais famosos!!
Uma casa recuperada, o desenho como instrumento de trabalho do arquitecto

… arquitectura?... mais alguma profissão ou passatempo ...
(...)
Ser arquitecto é algo muito bonito que se torna difícil explicar em palavras que vocês entendam..!!
Ser arquitecto é entender o que as pessoas são, pensam, sentem, como vivem, quando se sentam ou quando se deitam , como vêem televisão, como se vestem… ou seja, para fazer uma casa, um móvel, uma biblioteca, temos que desenhar em função da forma como as pessoas vão usar esse espaço.. ou não!!, mas isso já um discurso demasiado longo e teórico para vós... Então torna-se numa profissão que nos leva a saber e pensar de uma forma global, geral, ampla.. temos de ser um pouco advogados, um pouco sociólogos, um pouco engenheiros, e outros..

Por isso somos mais sensíveis a algumas questões que outras profissões não precisam nem costumam estar..
O sol a chuva, o vento..
Por isso somos um pouco poetas, pintores e músicos…
Eu… particularmente, também sou músico, mas também professor na universidade em Coimbra.
O ser professor, ensina-me a estar perto de pessoas que também querem ser arquitectos e por isso ajuda a entender.. e por isso pensar muito no que faço.. e isso ajuda-me a ser melhor..
Como musico, aprendo a falar, estar em palco e em público, a ser poeta, a ser ritmado, impor regras como compassos musicais, falar e cantar sobre temas e pessoas, lugares e sentimentos. Esses sentimentos e essas sensações, uso-os como arquitecto.
Por outro lado, imagina que fiz uma loja de roupa!!!
E muitas da mesma marca!? E para além das lojas defini juntamente com os estilistas e com os donos da marca a imagem da própria marca…
…Então estive ligado á moda, assisti a desfiles, falei e convivi com modelos, desenhei roupa e vesti as modelos com uma ideia que começa num papel, numa loja, numa prateleira.. Com esta experiencia enriqueci a minha forma de ver outras área que não meras casas ou paredes
E um jardim-de-infância!
Já viste que tenho de me imaginar como um bebé que rasteja e gatinha!!! Para que ele se sinta bem.. uso a cor… cadeiras tão pequenas que os adultos não sentam…. Janelas e coisas que só as crianças entendem…
Isso é a parte mais bonita que te falei. Torna a minha profissão em muitas ao mesmo tempo!!..

Influências
Sim. Muita… do meu pai, de viagens que fazia.. de um professor que não sendo boa pessoa, foi quem mais me ensinou a ser como sou enquanto arquitecto. Dum primo e de um colega que sabiam desenhar muto bem. E de muitas outras coisas que no dia a ia, nos levam a fazer escolhas e sem querer estarmos absorvidos numa área de trabalho como esta e não poder voltar atrás.
(...)
vida pessoal e profissional…
Muito difícil, mas basta saber dosear, ter consciência do que podemos fazer e estabelecer prioridades. Quando vejo que a minha vida como arquitecto está a interferir com a minha vida pessoal ou familiar, só tenho que parar um pouco e pensar o que é mais importante para mim.
(...)
…É cansativo ser arquitecto?!
Muito!.. mas como é muito bonito.. deito-me e sorrio cansado.. hoje mudei um pouco o mundo!!!… ficamos a ganhar!
(...)
.. custa-lhe ter ideias para fazer projectos?
Sempre! Sempre que começo um projecto novo e coloco uma folha em branco, o exercício é o mesmo. Como faço? por onde começo?, o que faço primeiro?.. por isso é bonito e se torna um desafio….e por isso recorro á poesia, a uma paisagem, a um sentimento, a uma ideia que já tive ou a uma conversa que partilho com os meus colegas.
(...)
“Idealizar ideias”…
Isso é um pleonasmo! E a nossa vida é isso mesmo.. a repetição de ideias já feitas que tivemos, que vimos, que ouvimos, que sentimos e depois de trabalhar um ideia, evoluir, adaptar..
Que pensas de uma maquina de lavar para uma porta de entrada?
Depois de entenderes o qeu é possivel fazer e como fazer, uma velha porta de uma máquina dá lugar a uma porta de um Showroom de uma marca ou de um afabrica que… não é mais do que uma lavandaria e tinturaria..

E um elefante e um golfinho para um jardim?
E de um castelo para uma casa?
E de uma casa em forma de caixinhas de lego?
São essas as… “ ideias que vamos idealizando!”

O Trabalho sozinho
(...)
Nunca!. Um arquitecto, nunca trabalha sozinho. Com colegas, com os clientes, com os amigos, com os engenheiros, com os trolhas e carpinteiros, e se faltar alguém… um filho pode ser sempre uma ajuda para ter uma ideia…



(...)
Nuno Mário Costa Oliveira, arquitecto

“Conceitos de reabilitação e abordagem ao património edificado”


Comunicação

Notas introdutórias

Após um período de maior atenção ao património, por consciência ou mera coincidência de vários concursos e obras executadas, durante a década de 70 e 80, deu-se na década de 90 uma estagnação, ou diria mais, diminuição das encomendas e menor atenção ao património mais notável e mais significativo por parte de um público geral e especifico de arquitectura.

Como venho defendendo ao longo das minhas prelecções e aulas, toda uma panóplia de circunstâncias e condicionantes levam a uma exercício e uma postura distinta e periódica na arquitectura ao longo dos tempos, quer por parte dos profissionais, quer por parte do estado e encomenda pública, quer ainda pelo cidadão comum.

São muitas as condicionantes, desde sociais, politicas, religiosas, entre outras, que levam a que a arquitectura viva períodos de grande valorização e especificamente atenção a alguns aspectos e logo tomada por mercenários da construção sem regras, ou com regras a que chamaria menos nobres porque menos reflectidas e cuidadas no património edificado. A história assim nos ensina, desde as grandes civilizações a pequenos aspectos, muitas vezes pontuais e subtis em que um incêndio, ou uma guerra vem marcar uma posição, uma volta na atenção à arquitectura e à sua importância no panorama urbano, ou um simples acordar e reflectir para algumas questões.

Assim, recordando a história: se um inquérito à arquitectura popular resulta num sentimento colectivo de interesse pelo tipo de arquitectura mais genuína, ou, contrapondo, se os arquitectos sedentos de encomenda e reflexão, usam como pretexto uma vontade meramente politica da descoberta de uma identidade nacional para assim poder falar sobre, descobrir, experimentar e consequentemente desenvolver uma nova forma de ver e fazer arquitectura; se recordarmos e entendermos o aparecimento das ordens mendicantes e o que estas provocaram, quer no espaço urbano fora e dentro das muralhas, e consequentemente no modo de vida e vivência das populações aculturadas por uma nova dimensão religiosa; ou mesmo se remontarmos a uma sociedade pujante, traduzindo-se quase de uma forma subtil quanto inquantificável, num barroco, ou rocócó, ou num gótico com referências às descobertas marítimas, podemos aqui mais uma vez, com a pouca distância que nos separa, constatar que vários factores levam à conclusão que pretendo apresentar aqui e à preocupação que desenho nestas palavras, de desabafo, e mesmo consternação, face à apatia e indiferença pelo tema e problema aqui apresentado.

Referia-me a várias condicionantes que levam a que a atenção ao património sejam periódicas e sempre relacionadas com factores económicos, políticos, sociais entre muitos e que se reflectem no resultado em obra feita e no simples exercício profissional do arquitecto. No momento reduzo a uma intenção muito limiar do nada, apenas abordada ocasionalmente e a medo, por um pequeno reduzido numero de profissionais que resiste a debater, defender e querer manter viva a chama do discurso e reflexão sobre este tema.

Sem referir ou aprofundar muitas condicionantes, falemos em algumas que vem influenciar o panorama actual da intervenção no património, afirmando no entanto que as apresentadas não as entendo ou classifico como principais, mas que pretendo referir com relevantes para o panorama actual.

A encomenda e aspectos económicos
“Realização de grandes obras e concursos”

1. Um dos aspectos que considero ter sido preponderante para a realização de grandes obras e concursos, grandes reflexões de arquitectos de nomeada, e mesmo de uma atitude global perante o património, nos anos 70 e 80, foi sem dúvida o aparecimento de uma perspectiva económica favorável no país e que veio por sua vez favorecer este tema. Refiro-me às grandes encomendas do estado, numa crescente capacidade económica quer deste, quer do privado, e um sentimento colectivo de valorização do património. O mesmo se passou nos últimos anos se pensarmos no espaço urbano relacionando cidades confrontantes com rios e mares, desenvolvendo através do “programa polis” este novo surto de encomendas e por isso novo alento e nova onda de apreciações e experiências profissionais.

Recordo os inúmeros concursos de ideias e associados a estes, a realização de projectos de reabilitação no património mais significativo como Refoios, cadeia da relação, igreja de santa clara, sagres, conventos e mosteiros, exemplos dos quais falarei e exemplificarei na parte prática como justificação e materialização do que aqui refiro e que até ás intervenções em áreas históricas, foram uma constante nesta década citada. Isto só poderia ter acontecido com a vontade e atenção por parte do estado, mas também pelas condições oferecidas e proporcionadas pelo crescimento económico de então.
Passada a euforia, ficou obra feita, reconhecida e por isso referência para as actuações no património nacional edificado. Se agora diminuída a sua atenção, verdade é que essas referências continuam a inspirar pela crítica e observação, algumas intervenções que aqui e além se vão notando, às vezes até em pequenas intervenções particulares e de menor importância patrimonial.

Sendo assim deve-se na minha opinião ao actual estado de estagnação, ou adormecimento deste tema tão querido que é o respeito pelo património edificado. A ausência de grandes encomendas e uma vontade política de activar mecanismos de reabilitar e fazer uso de edifícios que ora se encontram por reabilitar ora se limitaram no passado a serem total ou parcialmente recuperados mas sem grande significado para a actual conjuntura cultural.

Com efeito, o facto de que se esqueceu o tema do património na linguagem corrente, como respeito pela história, pela identidade pelo nosso Património resultou num adormecimento da atenção que duas décadas teriam de diferente na atitude da população.

A influência das referências no meio académico
“A atenção do aluno de arquitectura”

2. Um dos aspectos que, pela positiva, marcou esta atenção pelo tema, foi o facto de que referências no meio académico como Fernando Távora entre outros arquitectos, tiveram nessa altura em mãos a possibilidade de intervir e ver realizadas as suas intenções em planos e projectos.
Logo, a atenção do aluno de arquitectura, e pela orientação do docente, levou a tornar-se num tema corrente, extraordinariamente citado e motivo de reflexão.

Pese ainda que este tema, na minha opinião, requer não só a capacidade do aluno em representar graficamente, ou seja, projectar em desenhos bidimensionais, com maior ou menor conceptualidade e formalismo, mas acresce uma atenção redobrada pelo existente, pelo respeito com algo que já por si tem uma identidade, uma história, um peso, uma condicionante muito forte.

É assim que vejo o património, se me refiro aquele mais significativo porque representativo de uma época, de um lugar, de uma identidade, seja ela urbana ou meramente edificada.
(…)
Claro que, no contexto deste conjunto de reflexões e da publicação prevista, importa referir aquelas condicionantes que de uma forma clara importam e influenciam, o objectivo, sendo apenas algumas das que poderiam ser citadas e nem sempre as mais importantes.

O ensino, sendo eu crítico sobre a forma e as direcções que levamos nesta particular década, perante o papel do arquitecto, mais particularmente na sua valorização ao nível do património, tem descurado esta temática.

Comecemos por um aspecto. Se nos ensinamentos e práticas do ensino da arquitectura, este tema não fizer parte integrante, ou mesmo abordado de uma forma superficial como apenas um campo de acção profissional, o mesmo tema se desvaloriza e é assimilado de uma forma superficial.

Não chega um ano lectivo ou um semestre sobre o tema património sem uma conjunto articulado de matérias, de exercícios projectual, que levem o aluno a desenvolver a sua capacidade crítica sobre a intervenção no património a par com as especificidades de intervir neste campo.

O facto de vivermos numa época de plasticismos e formalismos, meros exercícios de brincadeiras geométricas, repetindo, reproduzindo os modelos que vão aparecendo em capas de revista dos autores da moda, ou numa segunda instância, a tentativa de fazer arquitectura pela espectacularidade e diferença dos alçados e plantas sem recorrer à essência do próprio exercício profissional, acabamos por não só não te r tempo para reflectir sobre o que existe, o que está feito, o património existente, e por outro lado, perder a capacidade de construir um dialogo, um discurso, uma capacidade de entender, de criticar a metodologia de abordagem, os raciocínios inerentes á nossa profissão de arquitecto.

O comportamento e uso dos espaços por parte das populações.
“Os hábitos e costumes, reflectem-se na vivência dos espaços”

3. Outro aspecto que me importa referir, é o comportamento e uso dos espaços de uma forma natural, intuitiva, habitual das populações. Quero dizer, quando construímos um fórum, uma praça como os paços do concelho, uma série de centros comerciais espalhados pelas cidades, estes fenómenos vem sem sombra de dúvida, trazer hábitos, costumes, e reflectir-se na vivência dos espaços e relação dos espaços entre si.
Mais uma vez recorrendo à história, o aparecimento das ordens mendicantes ou uma feira de troca comercial de produtos à porta de uma cidade amuralhada, uma vila de foral que se transforma e faz desenvolver uma pequena urbe ao longo do seu eixo-traçado principal, e resultando mais tarde numa cidade que reflecte o crescimento e dependência deste eixo, na malha urbana actual, são aspectos que subtilmente marcam o uso dos espaços e importância no desenvolvimento das cidades.

Resumindo, um primeiro aspecto a referir é então o facto de que muitas são as condicionantes para que o tema ”património” seja mais visível, mais valorizado e consequentemente mais alvo de atenção e intervenção do arquitecto em projectos de valorização, reabilitação restauro etc.

Edifício Zeferino da Costa - Nuno Oliveira
Recuperação do Chiado- Álvaro Siza

- A questão da abordagem ao programa e conceito de intervenção, formas de interpretar o programa como uso posterior do espaço, a lógica da intervenção.
- Varias formas de interpretara a intervenção no património, uma postura mais intervencionista e provocatória de novas formas de uso dos espaços, reinventar os claustros, a celas os conventos, os quartéis e os mosteiros, transformados em hotéis, hospitais, cadeias, escolas etc.
Ou uma postura mais conservadora e museológica.
Os museus em palácios onde as sala e quartos se ligavam entre si, como uma sequencia espaços museológicos e ou adaptados de uma vivência social e programa habitacional.
- A forma de atacar o património e valorizar, os critérios de intervenção, as definições apriorísticas de classificar o bom e o mau, uma linha polémica ou
Casos práticos abordados
Casos apresentados:
. Plano de intervenção em Vila Nova de Gaia - acções para recuperação e reabilitação do centro histórico
Quando se fala em reabilitar falamos mais uma vez em dar vida nova ou mesmo fazer reviver um espaço que perdera a sua vida intrínseca. Podemos encontrar neste caso particular um exemplo de como o espaço pode ganhar uma vida própria, quiçá diferente da que teria através de novos usos, de criação de pequenos equipamentos ou serviços que por arrasto possam trazer esta animosidade e importância do espaço urbano.
O caso de gaia remonta ao tempo em que se debatia a espectância dos terrenos e grandes áreas de armazéns, que outrora tiveram uma importância urbana quase crucial e centro de sobrevivência de Gaia.
Vemos ainda um aspecto que e o facto de que esta alteração do espaço urbano por si veio valorizar o tema “Vinho do Porto”.
Por duas formas.
Porque sob este tema ou propósito veio qualificar uma área urbana caída à degradação e por isso ganhar uma nova dinâmica.
Mais ainda pelo facto de que criando esta nova dinâmica, valoriza o próprio tema vinho do porto.
O engarrafamento na origem foi uma das razoes porque este plano apesar de lento e diluído no tempo demorou a ser posto em pratica mas ao mesmo tempo o ponto de viragem para a imagem de cidade que hoje encontramos e
Claro que este tipo de actuações não podem ser vistas senão numa acção concertada que vais desde um estudo exaustivo das artérias viárias e infra-estruturas criadas, áreas diversificadas de ocupação tipológica do espaço ou muitas outras condicionantes a contemplar.
No entanto, apesar de continuarem a existir estas áreas de armazém expectantes, vemos aqui a alteração profunda de uma cidade, ou deveríamos dizer de duas áreas de cidade que ladeiam um rio, ganhando agora tamanha importância como centro cívico como á séculos atrás por outros motivos já ocupara este lugar.
Uma praça, um jardim, um, percurso, um estacionamento, um clube fluvial transformado em clube náutico, um tasco virado restaurante típico, ou pequenas outras alterações são sem sombra de duvida uma mais-valia para a reabilitação do espaço urbano.

Por outro lado outro aspecto que importa referir é o facto de que socialmente a recuperação e reabilitação de um simples imóvel pode desencadear uma série de actuações ao novel privado.
Recordo que uma politica de reabilitação apregoada e posta em prática pelo cruarbe entre outros núcleos de intervenção em centros históricos seria a de intervir num caso concreto, um edifício concreto, através de intervenção directa, ou apenas por incentivo até económico.
Este facto socialmente despoleta um sentimento de rivalidade sadia, de inveja positiva pois desencadeia uma vontade do privado em querer alterar e usufruir destas condições valorizando o seu património.

Essa tem sido na minha perspectiva a arma mal usada mas felizmente já comprovada em alguns casos como a melhor forma de que a cidade cresça e acorde para esta importância, pois tudo se passa ao ritmo não de uma intervenção pontual e por vezes até polémica e condicionada pela mudança exagerada e por isso não facilmente aceite ou.. em contraposição se lenta e estratégica, facilmente posto em pratica verdadeira reabilitação do espaço porque subtilmente incitada, incentivada e por arrasto assimilada pela população geral.

Outras pequenas intervenções como ponte de lima e ponte da barca vieram devolver a presença do rio e relação deste com a urbe que o ladeia.
A criação de equipamentos e áreas públicas tratadas, se sustentadas por estes equipamentos vem dignificar por uma lado a cidade mas também ser o garante do investimento da autarquia.
Na Covilhã mais um local de importância do programa polis para a reabilitação desta área ribeirinha.
No centro da cidade e ao longo deste rio, a revitalização e recuperação do património construído das antigas fabricas e casa e que vieram garantir a viabilidade concretização do espaço devolvendo o rio á cidade.

. Plano de salvaguarda para Guimarães o centro, os equipamentos, a consciência colectiva - exaltação do património
Bretanha plano de reabilitação
. Plano de salvaguarda de V. N. de Famalicão - Casos particulares.
. Londres. Regulamentação e controle de materiais e sistemas de construção.
.Casa D Laura
.Castelo de Barbacena - Alentejo, proposta de recuperação.
. Equipamento em Coimbra - Reabilitação e transição com centro histórico.
. Recuperação do Chiado, - regulamento específico.
Edifício PSD
. Outros casos abordados

Um projecto ambicioso

Uma ambição e um desafio talvez maior do que seja possível!
Uma promessa sem promessas pois já passou o tempo, e sem tempo não vejo possível fazer aquilo a que me proponho.
Mas é assim que vou traçando a minha vida! Estabelecendo uma bitola tão alta quanto possa para não ver o fim muito perto... ou diria estar quase cumprido. E esse é o momento da minha fraqueza.
Assim, entre revisões de escritos passados, pensamentos que vou materializando em aulas e documentos escritos, fica a promessa de, complementando um "site", quase no fim perto!, poder num espaço como este, dar aso a leituras, debates e troca de informações.
Partilho assim com gosto o que sei, com aqueles que ao ler me obrigam a reflectir, manter acesa e presente a vontade de evoluir no pensamento e crescer como arquitecto.
Aos meus alunos que considero, espero esta informação ser útil, pelo menos para criar espaço de debate e confronto de ideias, objectivo deste projecto e a eles agradeço o desafio.

nuno oliveira m, arquitecto

Hospital de barcelos

Hospital de barcelos