25/08/08

excertos de uma entrevista-"O papel do arquitecto"






"O papel do arquitecto"



O gosto pelo que faz…
Sim, muito!. Não escolheria outra profissão. No entanto, desempenho outras profissões que complementam e me realizam como pessoa e como arquitecto. O ensino, a música e a família.
(…)
Sobre a escolha…
Sim, ou melhor… não sabia o quanto desempenharia na sociedade um papel tão importante. Ser arquitecto afinal, não é só fazer projectos, mas sim, conhecer as pessoas que vivem os espaços que eu projecto, outras culturas se falarmos em projectos fora da nossa área de trabalho e por isso conhecer outras realidades, outras pessoas, outras culturas, outras identidades.
(...)
Dificuldades…?
Sim. O facto de me ter descurado no ensino complementar!!. Perdi um ano porque me deixei adormecer pela irresponsabilidade de não estudar!! Entre outros momentos e num ímpeto meio adolescente, decidi ir para a força aérea. Vejam lá!! …E senti a falta de todas as matérias que deveria ter aprendido mais e melhor… até no ensino complementar...
(...)
“Tendo em conta que é um bom arquitecto como acha que chegou a essa opinião?”
(sorriso)!! Seria pretensioso da minha parte considerar-me um bom arquitecto, mas na verdade, sou obrigado a reconhecer que sim... Sou bom arquitecto!..
Por vários motivos:
Trabalhei muito para não ser apenas um arquitecto… estudei, procurei evoluir, aprender sempre, nunca achar que já sabia… em cada obra, em cada um dos muitos cursos que exageradamente decidi tirar na perspectiva de querer saber um pouco de tudo!!, com cada um dos meus carpinteiros, serralheiros, trolhas ou outras especialidades, procurei sempre ouvir, escutar, perguntar e assim descobri que tinha sempre muito que apreender. A humildade em achar que temos sempre muito mais para saber ajuda a crescer como profissional e como pessoa e ser sempre melhor.
Por outro lado, agora que sou professor desta área e que vi a arrogância com que muitos alunos entram num curso superior e pensam que ser arquitecto é ter um diploma, vejo e sinto-os no seu desempenho com alguma mágoa e tristeza. De certa forma, por vezes envergonho-me das suas atitudes e da sua forma de estar como profissionais… e então aí ganho com a tristeza, consciência que sou melhor de que eles.. infelizmente porque cada vez menos ambicioso por uma capa de revista e mais pelo reconhecimento de fazer bem!!
Mas concluo, olhando para os que são ainda melhores…:
- Ainda tenho muito que apreender…!
Por fim, lamentavelmente chegando a essa conclusão, percebo que tenho uma responsabilidade acrescida sobre a cidade, sobre as pessoas, sobre a nossa cultura…e quando vejo que o que faço mal, provoca mau estar e quando faço bem sinto o que melhor pode sentir um arquitecto.. funciona bem!.. e é bonito!!
(...)
maior projecto…
Todos os meus novos projectos são sempre os melhores e cada vez aprendo mais e sinto que vou dar melhor e mais do que já dei, seja um casa, um edifício, uma rua, ou um móvel.. é o mal de ser arquitecto…. Nunca paramos e sonhamos em cada projecto que este ,…. Sim ..!!!.. este vai ser o melhor da nossa carreira..
Hoje talvez uma recuperação de uma fortaleza em cabo verde!!
Amanhã… a tua casa!
(...)
outra profissão
Sim, cantor, musico, médico, e acho que a minha profissão ensina acima de tudo a organizar a minha vida, as minhas tarefas, sempre com uma ordem, com uma lógica e organização de pensamento, por isso, agora posso dizer que até gostava de experimentar outras profissões. Já fiz trabalho de carpinteiro, de trolha, de electricista, mas gostava sempre de aprender outras áreas fora da minha profissão..
(...)
Alguma vez… …pensou em desistir?
Não pensei!!.. Desisti, várias vezes!
O meu curso na altura era muito difícil!!.. , muito trabalho, dormia 4h por dia durante muitas semanas. fiz muitas directas, estudei arte, história, sociologia, matemática, geometria, física e para alem disto, os meus desenhos, os meus projectos…
E se no inicio do curso não levei tão a sério, logo vi que não podia ser o pior.. pensei sempre.. se tentar ser o melhor.. posso não conseguir sê-lo, mas porque tentei muito… pelo menos seria bom,!! Foi esse o lema de toda a minha vida..

Por isso desisti duas vezes. Uma dessas… arrumei a mala, deitei fora o trabalho e desisti. Num almoço, a minha namorada e família, convenceram-me que pelos menos não perderia o ano lectivo se tentasse acabar com o que tinha…
Não dormi durante uma semana…
Mas acabei!.. e foi o melhor ano da minha vida e das maiores lições. fui o melhor aluno do ano e esse ano foi o que me levou a ser convidado para trabalhar com vários arquitectos .. Eles sim mais famosos!!
Uma casa recuperada, o desenho como instrumento de trabalho do arquitecto

… arquitectura?... mais alguma profissão ou passatempo ...
(...)
Ser arquitecto é algo muito bonito que se torna difícil explicar em palavras que vocês entendam..!!
Ser arquitecto é entender o que as pessoas são, pensam, sentem, como vivem, quando se sentam ou quando se deitam , como vêem televisão, como se vestem… ou seja, para fazer uma casa, um móvel, uma biblioteca, temos que desenhar em função da forma como as pessoas vão usar esse espaço.. ou não!!, mas isso já um discurso demasiado longo e teórico para vós... Então torna-se numa profissão que nos leva a saber e pensar de uma forma global, geral, ampla.. temos de ser um pouco advogados, um pouco sociólogos, um pouco engenheiros, e outros..

Por isso somos mais sensíveis a algumas questões que outras profissões não precisam nem costumam estar..
O sol a chuva, o vento..
Por isso somos um pouco poetas, pintores e músicos…
Eu… particularmente, também sou músico, mas também professor na universidade em Coimbra.
O ser professor, ensina-me a estar perto de pessoas que também querem ser arquitectos e por isso ajuda a entender.. e por isso pensar muito no que faço.. e isso ajuda-me a ser melhor..
Como musico, aprendo a falar, estar em palco e em público, a ser poeta, a ser ritmado, impor regras como compassos musicais, falar e cantar sobre temas e pessoas, lugares e sentimentos. Esses sentimentos e essas sensações, uso-os como arquitecto.
Por outro lado, imagina que fiz uma loja de roupa!!!
E muitas da mesma marca!? E para além das lojas defini juntamente com os estilistas e com os donos da marca a imagem da própria marca…
…Então estive ligado á moda, assisti a desfiles, falei e convivi com modelos, desenhei roupa e vesti as modelos com uma ideia que começa num papel, numa loja, numa prateleira.. Com esta experiencia enriqueci a minha forma de ver outras área que não meras casas ou paredes
E um jardim-de-infância!
Já viste que tenho de me imaginar como um bebé que rasteja e gatinha!!! Para que ele se sinta bem.. uso a cor… cadeiras tão pequenas que os adultos não sentam…. Janelas e coisas que só as crianças entendem…
Isso é a parte mais bonita que te falei. Torna a minha profissão em muitas ao mesmo tempo!!..

Influências
Sim. Muita… do meu pai, de viagens que fazia.. de um professor que não sendo boa pessoa, foi quem mais me ensinou a ser como sou enquanto arquitecto. Dum primo e de um colega que sabiam desenhar muto bem. E de muitas outras coisas que no dia a ia, nos levam a fazer escolhas e sem querer estarmos absorvidos numa área de trabalho como esta e não poder voltar atrás.
(...)
vida pessoal e profissional…
Muito difícil, mas basta saber dosear, ter consciência do que podemos fazer e estabelecer prioridades. Quando vejo que a minha vida como arquitecto está a interferir com a minha vida pessoal ou familiar, só tenho que parar um pouco e pensar o que é mais importante para mim.
(...)
…É cansativo ser arquitecto?!
Muito!.. mas como é muito bonito.. deito-me e sorrio cansado.. hoje mudei um pouco o mundo!!!… ficamos a ganhar!
(...)
.. custa-lhe ter ideias para fazer projectos?
Sempre! Sempre que começo um projecto novo e coloco uma folha em branco, o exercício é o mesmo. Como faço? por onde começo?, o que faço primeiro?.. por isso é bonito e se torna um desafio….e por isso recorro á poesia, a uma paisagem, a um sentimento, a uma ideia que já tive ou a uma conversa que partilho com os meus colegas.
(...)
“Idealizar ideias”…
Isso é um pleonasmo! E a nossa vida é isso mesmo.. a repetição de ideias já feitas que tivemos, que vimos, que ouvimos, que sentimos e depois de trabalhar um ideia, evoluir, adaptar..
Que pensas de uma maquina de lavar para uma porta de entrada?
Depois de entenderes o qeu é possivel fazer e como fazer, uma velha porta de uma máquina dá lugar a uma porta de um Showroom de uma marca ou de um afabrica que… não é mais do que uma lavandaria e tinturaria..

E um elefante e um golfinho para um jardim?
E de um castelo para uma casa?
E de uma casa em forma de caixinhas de lego?
São essas as… “ ideias que vamos idealizando!”

O Trabalho sozinho
(...)
Nunca!. Um arquitecto, nunca trabalha sozinho. Com colegas, com os clientes, com os amigos, com os engenheiros, com os trolhas e carpinteiros, e se faltar alguém… um filho pode ser sempre uma ajuda para ter uma ideia…



(...)
Nuno Mário Costa Oliveira, arquitecto

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